quinta-feira, 9 de março de 2017
Os Maias - linguagem e estilo queirosiano
Ficha informativa sobre a Linguagem e Estilo Queirosiano
A prosa de Eça de Queirós reflete a sua forma de pensar e exprime facilmente o seu modo de ver o mundo e a vida. Este soube explorar, a partir de um vocabulário simples, a força evocativa das palavras com o uso de sentidos conotativos e relações combinatórias. Através de processos como: o ritmo da narração, a descrição, o diálogo, monólogos interiores e comentários, o romancista conseguiu imprimir nas suas palavras um verdadeiro encanto.
Apresenta um estilo literário dualista. Por um lado, descreve de forma fiel a realidade observável e, por outro, a fantasia e a imaginação do escritor realçam essa mesma descrição. Deste modo, deixa transparecer as impressões que lhe ficam da realidade, mostrando considerar não bastava descrever pormenorizadamente aquilo que se observava, mas que também era necessário manifestar os sentimentos que resultam dessa observação.
Assim, além de descrever pormenorizadamente, soube revelar a sua visão crítica sobre a sociedade dos finais do século XIX.
Principais particularidades do estilo queirosiano
Eça apoia-se nos adjetivos e advérbios que transmitem uma sensação de visualização. Por vezes a adjectivação é dupla ou tripla, com vista a mostrar não só a descrição, mas também as impressões: "(…) sob a luz suave e quente das velas (…) ", "Uma gente feíssima, encardida, molenga, reles, amarelada, acabrunhada!..."
Quanto aos advérbios com valor de modo (sobretudo terminados em –mente), devido à sua sonoridade, foram trabalhados de forma a incidirem sobre o sujeito, mantendo as funções do adjectivo ou com o verbo: "(…) um dos sujeitos de flor ao peito berrava furiosamente com um polícia. (...) Tudo isto está arranjado com decência - murmurou Craft."
Também os verbos são utilizados com um carácter impressionista e suscitam a imaginação do leitor. Para escapar à monotonia imposta pelo uso de verbos semelhantes, Eça optou por substituir os verbos comuns por outros menos vulgares, mas que expressam mais amplamente a ação descritiva pretendida.
Os verbos declarativos (disse, afirmou, observou, explicou, respondeu, prosseguiu, …) são comuns para introduzir falas de personagens e por isso tornam o discurso monótono, pelo que, o escritor opta por suprimi-los, ou substituí-los por outros mais sugestivos, como praguejar, rosnar, ….
É usual o uso do pretérito imperfeito em obras realistas, pois este tempo aproxima do presente as ações realizadas no passado. Quando é utilizado o pretérito perfeito é narrada uma ação passada e concluída. Com o uso do pretérito imperfeito, pela transposição dos eventos narrados até ao tempo presente, faz com que o leitor que possa testemunhar o acontecimento narrado.
A prosa queirosiana é ainda enriquecida com vários recursos estilísticos. Aquelas que se podem destacar por melhor representam o estilo de Eça são:
- a ironia – recurso estilístico que, por expressar o contrário da realidade, serve para satirizar e expor contrastes e paradoxos: “(...) Tudo isto está arranjado com decência - murmurou Craft." (Os Maias)
- a hipálage, ao atribuir uma qualidade de um nome a outro que lhe está relacionado, revela a impressão imediata do escritor perante o que está a descrever: "Fumando um pensativo cigarro." De modo algum o cigarro é pensativo, o que temos é a impressão imediata do escritor ao observar o fumador a pensar; "Um sempre um vago martelar preguiçoso" não qualifica o martelar mas sim o trabalhador, que é preguiçoso no seu ofício.
- a sinestesia, que, ao apelar aos sentidos para nos descrever um determinado ambiente, transporta-nos para esse mesmo ambiente, servindo não só para nos descrever com realismo o cenário envolvente mas também para nos tornar testemunhas desse mesmo cenário: "Defronte do terraço os gerânios vermelhos estavam já abertos (visão); as verduras dos arbustos, muito tenras ainda, de uma delicadeza de renda, pareciam tremer ao menor sopro (visão), vinha por vezes um vago cheiro de violetas, misturado ao perfume adocicado das flores do campo (olfacto); o alto repuxo cantava” (audição e visão).
- a aliteração, que, através da repetição de sons, pretende exprimir sensações ou os sons da realidade envolvente: "Então, abrasado, fui ouvindo todos os rumores íntimos de um longo, lento, lânguido banho(…)" e "(…) passos lentos, pesados, pisavam surdamente o tapete." (Os Maias).
Estilo indireto livre - Para evitar a utilização constante dos verbos declarativos, Eça criou o estilo indireto livre. Assim, a pontuação não pretende servir a lógica gramatical. Está mais ao serviço do ritmo da frase para, por exemplo, marcar pausas respiratórias, para revelar hesitações ou destacar elevações de vozes. O processo consiste em utilizar no discurso indireto a linguagem que a personagem usaria no discurso direto, ou seja no diálogo. Deste modo, o texto ganha vivacidade e evita a repetitiva utilização de disse que, perguntou se, afirmou que, ..., criando a impressão de se ouvir falar a personagem. «O marquês gostava de Gambetta: fora o único que durante a guerra mostrara ventas de homem; lá que tivesse «comido» ou que «quisesse comer» como diziam – não sabia nem lhe importava. Mas era teso! E o Sr. Grevy também lhe parecia um cidadão sério, ótimo para chefe de Estado...»
Escola Sec. de Fafe, março de 2017 - Professor A.Teixeira
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