sexta-feira, 3 de março de 2017

Natal de hoje

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Natal de outrora, hoje
  
Entre os negros potes de ferro,
Chamas vivas roíam os troncos.
As três mulheres, em estranha dança,
Sincopada, acesa e ritmada,
Cruzavam-se no lajedo da cozinha,
Orquestra de sabores e cheiros:
Batatinha esmigalhada, com espinhas
Do fiel amigo das águas frias;
Pão molhado em rabanadas,
Mexidos com canela e mel,
Aletria em pratos rasos.

  
Lá fora, o frio franco
Convidava ao aconchego.
Os homens iam tecendo
Conversas de circunstância.
Porta adentro, odores intensos,
O fumo leve, a azáfama,
Criançada em correrias,
No vai vem das escondidas
Atrás dos móveis, sob as camas
E a magia do reencontro.



E hoje o Natal é outro.
Sem a alegria da pequenada,
Sem a sabedoria dos avós…
O olhar doce de pai e mãe,
O sabor intenso da tradição,
O cheiro puro a salsa e louro,
O calor sereno da família,
Tudo perdido, para sempre
Roubado pelo tempo, cruel.
Ah, pudera eu voltar atrás,
Sentir o natal de outrora hoje.

  

Mas não. Nas ondas da tv,
Saturam imagens rotineiras,
Brinquedos, perfumes, modas,
músicas, filmes, más notícias…
Nas ruas, a pressa de entrar,
Filas nervosas, luzes intensas.
Tudo a comprar, tudo a comprar!
E o que falta? O que esquece?
É o marketing, sem novidade.
Pois do Natal restam só o nome,
A data e a nostalgia da verdade.


A.Teixeira, dezembro 2015

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